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A criação de Varas Empresariais de Primeira Instância no Tribunal de Justiça de São Paulo e sua rele



Renata da Gama Cruz Luz, graduanda em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, membro da Equipe de Competição e Estudos em Arbitragem – ECEArb, da UFRJ, e membro do Comitê de Jovens Arbitralistas – CJA, do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem – CBMA.

Ian Albert von Niemeyer, advogado, graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio, membro do Grupo de Estudos em Arbitragem e Direito do Comércio Internacional – GEADICI, da PUC-Rio, e membro do Comitê de Jovens Arbitralistas – CJA, do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem – CBMA.




A despeito de todas as vantagens e desvantagens que já foram minuciosa e exaustivamente tratadas pelos mais diversos meios de debate sobre arbitragem, é inegável que o método conquistou, especialmente após a promulgação da Lei 9.307/96 e o reconhecimento de sua constitucionalidade, uma fatia considerável do mercado contencioso do país, sobretudo o de disputas de alta complexidade e grande monta.


Aponta-se que só nos últimos seis anos, os conflitos resolvidos por meio de arbitragem cresceram 73%, somando mais de R$ 38 bilhões em disputa no período[1], tendo o Brasil alcançado o posto de quarto maior usuário do método no mundo[2]. Não só isso, a pujança deste mercado tem como reflexo também o recente surgimento no país de fundos especializados no financiamento de disputas arbitrais, como o Leste, fundado em 2014 e constituído com boa parte de capital próprio de 20 sócios para atuar no Rio de Janeiro e em São Paulo[3].


Outra grande prova do exponencial crescimento da arbitragem no país é, sem dúvidas, a possibilidade de adoção do método nas disputas envolvendo também a administração pública direta e indireta, como positivado pela recente inclusão dos parágrafos 1º e 2º no art. 1º da Lei de Arbitragem.


Tudo isso se reflete na jurisprudência dos tribunais que, cada vez mais, diminuem a resistência que outrora impunham ao instituto da arbitragem, por meio de decisões negando validade de cláusulas compromissórias ou recusando o cumprimento de decisões proferidas por tribunais arbitrais, que, como se sabe, dependem da cooperação do juízo estatal para garantir-lhes eficácia e coercitividade.


No entanto, as decisões neste sentido hoje representam uma minguante minoria da jurisprudência pátria, que há muito vem demonstrando uma mudança de sua postura em relação à arbitragem.


Atualmente, pode-se dizer que a resistência antes imposta pelo judiciário foi predominantemente substituída pela cooperação entre os dois juízos, inclusive por força legal. Exemplo disso foi a inclusão, pela lei 13.129/2015, dos artigos 22-A, 22-B e 22-C na Lei de Arbitragem, que tratam, respectivamente, da possibilidade de as partes solicitarem ao Poder Judiciário medidas de urgência na pendência da constituição do tribunal arbitral, e da prerrogativa do tribunal arbitral solicitar o cumprimento de suas decisões por meio do envio de carta arbitral ao Poder Judiciário.


Tais dispositivos, muito embora tão somente tenham positivado o que já era o entendimento pacífico da doutrina, denotam que a vontade do legislador é que o Poder Judiciário jamais atue como empecilho ao juízo arbitral, mas sim como seu auxiliar e garantidor da eficácia e do cumprimento de suas decisões.


Apesar disso, ainda hoje nos deparamos com decisões[4] que, na contramão do rumo que toma o poder judiciário como um todo, ainda parecem resistir ao crescimento e às novas formas de utilização da arbitragem, flexibilizando o princípio da competência-competência para adotar posições excessivamente protecionistas, como se houvesse uma disputa de territórios entre o judiciário estatal e o juízo arbitral, ou como se a adoção da arbitragem representasse algum tipo de cerceamento do direito de acesso à justiça, posição esta há muito superada desde o julgamento, pelo STF, da sentença estrangeira nº 5.206, quando se reconheceu a constitucionalidade da lei de arbitragem[5].


É neste cenário que, por um lado, é marcado pelo exponencial crescimento da arbitragem, mas por outro, ainda é conturbado em relação à cooperação judiciário-arbitragem, que a decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo de instaurar varas especializadas de direito empresarial na comarca da capital se mostram, mais do que um passo importante para a advocacia empresarial, uma vitória para os arbitralistas.


Isto porque, segundo notícia de dezembro de 2016[6], espera-se que as novas varas, denominadas “Vara Empresarial e de Conflito de Arbitragem”, trarão, por sua especialização, maior segurança jurídica ao empresário, que, frente ao cenário de crise vivido pelo país, onde há aumento de inadimplência e, consequentemente, de litígios, depende do judiciário não só para solucionar suas disputas comerciais e societárias, como também para dar cumprimento a sentenças proferidas em arbitragens dessa natureza.


Não é só. Espera-se também que as varas especializadas, ao conferirem maior segurança jurídica para o instituto da arbitragem como um todo, incentivem ainda mais a adoção de cláusulas compromissórias em estatutos sociais e contratos empresariais em geral, contribuindo assim para o florescente processo de popularização e consolidação da arbitragem no país.


Veja-se, ainda, que a nomenclatura escolhida para as varas não foi acidental, eis que grande parte dos litígios domésticos que seguem a via arbitral são disputas empresariais de alta complexidade, envolvendo grandes companhias ou instituições financeiras, que necessitam de celeridade e segurança quanto à solução do processo, justificando assim a escolha pela arbitragem.


Exemplo da relevância da arbitragem para conflitos societários, que exigem mais do que árbitros altamente técnicos e um procedimento flexível, mas também um judiciário estatal igualmente especializado e apto a auxiliar o tribunal arbitral, sem gerar obstáculos ao desenvolvimento do processo, é a atual disputa entre o fundo KKR e a Global Atlantic, com participação da família Nitzan, a respeito da aquisição da empresa brasileira de informática Aceco[7]. Com a instauração da arbitragem, a KKR pretende desfazer a operação pela qual desembolsou R$ 1.5 bilhão para aquisição da companhia, sob a alegação de que o fundo General Atlantic e a família Nitzan, fundadora da Aceco, teriam fraudado o balanço da empresa para ocultar passivos e passá-los adiante.


Como se vê, em casos dessa natureza, onde há, além de diversos e complexos interesses em disputa, uma premência de todas as partes envolvidas pela sua rápida solução, é nítido o benefício conferido por um juízo estatal especializado no apoio e cumprimento de decisões proferidas por um tribunal arbitral, conferindo assim a segurança e previsibilidade necessárias ao adequado desenvolvimento e conclusão da disputa, e para a eventual execução da sentença a ser proferida. Desse modo, é minimizado o receio de toda a parte envolvida em uma arbitragem, que é ter o seu direito reconhecido na sentença arbitral, mas não conseguir lhe dar eficácia em razão de eventuais empecilhos impostos pelo judiciário na fase de execução, perpetuando a disputa e tornando inócuos tanto o esforço como os recursos despendidos pelas partes durante o processo arbitral.



[1] GRILLO, Brenno. Soluções em arbitragem crescem 73% em seis anos, mostra pesquisa. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-jul-15/solucoes-arbitragem-crescem-73-seis-anos-mostra-pesquisa

[2] Brasil é o 4º no mundo em negócios feitos por arbitragem. Disponível em: http://www.caesp.org.br/brasil-e-o-4º-no-mundo-em-negocios-feitos-por-arbitragem/

[3] Fundos de investimentos brasileiros começam a investir em disputas arbitrais. Disponível em: http://www.valor.com.br/video/5155739598001/fundos-brasileiros-comecam-a-investir-em-disputas-arbitrais

[4] PIMENTA, Guilherme. STJ anula cláusula de arbitragem em contrato de franquia. Disponível em: http://jota.info/justica/stj-anula-clausula-de-arbitragem-em-contrato-de-franquia-27092016

[5] SE 5.206-Espanha (AgRg), rel. Min. Sepúlveda Pertence, 12.12.2001.(SE-5206)

[6] LUCHETE, Felipe. Justiça de São Paulo decide criar varas empresariais na capital. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-dez-14/justica-sao-paulo-decide-criar-varas-empresariais-capital

[7] BANERJEE, Devin. KKR Said to White Off First Brazil Deal Amid Aceco Legal Battles. Disponível em: https://www.bloomberg.com/news/articles/2016-10-12/kkr-said-to-write-off-first-brazil-deal-amid-aceco-legal-battles ; http://exame.abril.com.br/blog/primeiro-lugar/kkr-processa-antigos-acionistas-da-aceco/



 
 
 

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